Apresentadora é uma das profissionais mais importantes do jornalismo brasileiro
Redação Publicado em 04/03/2021, às 10h11
Um dos nomes mais importantes do jornalismo brasileiro, a apresentadora Glória Maria, 71, foi quem criou a reportagem de experiência da TV e já chegou a entrevistar personalidades como Michael Jackson e Freddie Mercury. Em entrevista à Revista Marie Claire, Glória relembrou de seus momentos, reportagens e experiências.
Glória carrega consigo uma carreira de dédacas na TV brasileira, sendo a primeira mulher negra que conseguiu um espaço de protagonismo na maior emissora do país, além de cobir guerra, apresentar telejornais com maior audiência e viajou o mundo, narrando aos noticiários sobre a vida de diferentes povos. Com a câmera ligada, em 1980 a apresentadora saltou de asa-delta da Pedra da Gávea. Causou polêmica ao fumar o primeiro baseado em um programa jornalístico em um programa sobre a Jamaica, além de já ter documentado a vida de nômades no Saara, em acampamentos nas montanhas da Nigéria.
A apresentador afirma que se inspirou em sua avó, Alzira, para cultivar seu pioneirismo: "Era a verdadeira chefe da família. Mal sabia ler ou escrever, mas tinha uma sabedoria incrível. E uma paixão por mim. Ela me ensinou o valor da liberdade. Quando contava histórias dos nossos antepassados, dizia que seus avós não tinham sido escravos porque foram beneficiados pela Lei do Ventre Livre, mas que um deles tinha sido laçado em Minas Gerais. Por isso, enfatizava: ‘Nossos antepassados foram acorrentados, então você não pode permitir nunca que lhe coloquem uma corrente, em nenhum aspecto da vida. Vivi com isso. Meu traçado foi ser livre".
"Com 14 ou 15 anos, entendi que queria trabalhar com a palavra. Minha mãe só me matriculou na escola até o primário. Depois, era eu quem fazia a matrícula sozinha. Sempre fui independente". Ela começou a trabalhar na administração da TV Globo quando tinha 16 anos anos e se candidatou a uma oportunidade de estágio no Jornal Nacional quando soube da oportunidade. Durante a noite, começou na radioescuta e fez sua primeira reportagem em 1971.
Glória afirmou que o racismo se manifestou em sua vida profissional e que chegou a receber uma carta quando começou a apresentar o Fantástico: "‘Como você, uma negra, está apresentando um programa? Esse lugar é de brancos’. E aí eu tinha que olhar aquela carta 10, 15, 20 vezes. Não era um post de internet, não tinha como apagar, nem ninguém que fosse brigar por mim. Aprendi a enfrentar e nunca suportar. Dizia na cara das pessoas qual era a intenção delas quando algo desse tipo acontecia. No meu tempo era eu, meu espelho, minha resposta e minha atitude".
A apresentadora ainda mencionou o Clube Renascença, da Zona Norte do Rio, que é tradicionalmente frequentado pelas famílias negras: "Fugia da escola e ia para lá, onde nasceu o Cacique de Ramos, do qual fui rainha. Foi nessa época que o jornalista Renato Sergio, da TV Manchete, me falou de Eldridge Cleaver e Angela Davis, que li com 15 anos". Ela nunca mais saiu da TV, para a infelicidade dos racistas, e acabou conquistando os postos mais cobiçados da Globo, viajando o mundo: "Um dos lugares em que eu procurava pautas era a Marie Claire. Lembro que li na revista uma matéria sobre as mulheres nômades do Saara. Na minha primeira viagem para lá, fui atrás delas. Lembro até hoje o nome da entrevistada, Safia, foi para o 'Fantástico'. Passar dez dias no deserto, sozinha com a equipe, na companhia dos nômades e dos camelos foi uma experiência que, se não me transformou profundamente, certamente me mostrou pedaços de mim que eu desconhecia".
Glória também fez uma viagem para o pé do Monte Everest: "O grande fascínio do tipo de jornalismo que faço é que me permite conhecer outras pessoas e, conhecendo outras pessoas, me conheço melhor". Durante 2007 e 2009, a apresentadora se ausentou da TV por vontade própria e viveu um período sabático na Índia, afirmando ter vivido outras das experiências fundamentais de sua vida, fazendo trabalhos voluntários no país, na Nigéria e também na Bahia. "No meu primeiro dia de sabático, o Nelson Chama, um amigo budista, ligou perguntando se eu queria ir para a Índia fazer um trabalho voluntário em um monastério. Topei na hora. Durante meses, acordava às 3 horas da manhã para colocar flores em volta do templo, depois servia o café da manhã dos monges".
Ela continuou: "Às 11 horas, colocava as sobras do café da manhã e do almoço para os mendigos que ficavam em um grande campo de futebol à espera de comida. À tarde, passava horas andando em volta de uma árvore que dizem que foi onde Buda recebeu a iluminação, falando os mantras. Foi uma experiência radical que mudou meus valores. Na Índia, ou você vive a sua vida ou se ferra. Ali aprendi a focar no que é meu. Vale pra tudo: carreira, dinheiro, sentimento". Durante esse período, ela decidiu adotar Maria (13) e Laura (12).
Laura carrega o nome da tataravó, que havia encontrado Glória em uma poça de sangue em um travesseiro no final de 2019. Glória desmaiou e bateu a cabeça na cozinha de casa, no dia anterior, após chegar de um jantar. Ela se levantou e foi dormir sem saber o que havia acontecido. A apresentadora viu o resultado do acidente no dia seguinte: "A primeira preocupação foi tranquilizar minha filha. Limpei tudo, fui ao quarto dela, mostrei que o machucado estava estancado e que não era grave". Ela descobriu um tumor maligno ao investigar a causa da queda e precsiou fazer uma operação rapidamente. "Aí sim elas ficaram preocupadas e precisei acalmá-las". A jornalista já havia sendo alvo de boatos que rodeavam sua vida.
"Não era um câncer, mas saiu em todo lugar como se fosse. Fake news sempre existiram". Durante a recuperação de sua cirurgia, ela acabou pegando uma grave pneumonia. "Aí fiquei assustada. Minhas filhas não têm como ficar sozinhas. Sabia que passaria por aquilo porque as meninas não podiam ficar desamparadas. É essa certeza que sempre carreguei e que me trouxe até aqui". Atualmente curada, a apresentadora afirma que sua integridade e saúde emocional são atribuídas à sua fé. "A arte de viver da fé, só não se sabe fé em quê”. Tem como ser mais livre?", disse.
A jornalista morava com a família na Vila Isabel, Rio de Janeiro, onde via a avó receber entidades: "As crianças não iam às cerimônias, mas às vezes os ‘caboclos’ entravam e ficavam andando pela casa. Morria de medo daquilo, me trancava no quarto e ficava escondida debaixo da cama. À medida que fui crescendo, passei a não levar aquilo muito a sério. Minha tia foi noiva por quatro anos de um homem que descobrimos que era casado. Como nenhum pai de santo viu aquilo? Eu mentia sobre as minhas notas na escola e ninguém descobria. Fiquei cética". Uma de suas bisavós por parte de mãe, Laura, tirava cartas e lia o futuro para clientes também em casa.
"Eu me escondia debaixo da mesa e ficava escutando. Achava que era tudo mentira, que ela enganava as pessoas. Minha mãe era católica. Eu também não acreditava naquelas histórias que ela e os padres contavam. Fazia muitas perguntas, sempre fui perguntadeira", finaliza Glória, que também foi batizada no catolicismo, realizando a primeira comunhão e a crisma.
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